domingo, 16 de agosto de 2009

We're not gonna take it

Ok, aqui vai a explicação do que tem acontecido nas últimas semanas. Eu estava esperando o desfecho da história para poder postar aqui, mas parece que tal desfecho não acontecerá tão cedo: Saímos eu mais três pessoas para tomar uns drinks (tá, cerveja) na região boêmia da nossa cidade. Apesar do grande número de blitzes, preferimos arriscar (já pensou se eu fosse instrutor de trânsito?). Ao sair do buteco ninguém quis pegar o Trovão Azul (estou para mudar o nome dele desde que descobri que este é um codinome para Viagra). Sobrou para este humilde servo.

Trovão estava estacionado numa rua que fazia esquina com a Afonso Penna. Avenida esta que os americanos que estavam hospedados na casa do meu amigo Édio ano passado chamavam de “hooker street”. Ô orgulho! Tive certa dificuldade de entrar na avenida, onde havia uma pequena fila de carros combinando programa com travestis que rodavam bolsinha no local. Nada contra quem tem esse tipo de procedimento. O cu é seu, você faz o que quiser com ele

Provavelmente dentro dos veículos estavam respeitosos pais de família dispostos a experimentar coisas novas. É a única explicação, já que tem tanta mulher do sexo feminino fazendo programa por aí. E olha que travestis, por possuírem mais recursos, devem cobrar até mais caro. Alguns caras até são até bem gostosas, com o peito e o bumbum esféricos. Mas aqueles ali pareciam o vocalista do Twisted Sister. Com a cara cinza de barba e tudo mais.

Como o sinal na Afonso Penna estava aberto, fui obrigado a parar atrás do último carro. Até tentei dar uma olhada pra ver se o Ronaldo Brilha Muito no Curintia estava por ali. Aí você me diz: “E o que o senhor estava fazendo na Afonso Penna sábado de madrugada, hein?”. Embora a história pareça suspeita, tenho três pessoas que podem testemunhar que eu não estava pegando traveco. Não naquele dia.

O carro da minha frente aparentemente perdeu a paciência de esperar o da frente dele combinar o preço e deu ré. Nisso ele bateu no meu carro, provocando avarias no meu pára-lama, como a ocorrência policial rebuscadamente disse. Na mesma hora, Viviana, que estava sentada no banco de trás, falou:

- Diogo, deixa eu descer para xingar esse filho da puta.

Deixei a esquentada mocinha descer, e voltei a estacionar, para conversar amigavelmente com o cara, que perspicazmente disse para Viviana:

- É, bateu, né?

Logo depois arrancou o carro. Talvez não só para fugir de me pagar o conserto, mas principalmente pelo constrangedor cenário em que eu o peguei. Lógico que eu ia analisar a cara dele com aquele olhar: “Ah safadinho! Eu sei o que você estava fazendo!”. Fora que ele deveria ter de se explicar para possíveis policiais e, quiçás, para seus parentes. Viviana berrou:

- Anotamos sua placa, filho da puta.

Disse isso levantando os braços e movimentando-os no ar. Viviana é foda. Acho que essa menina é nordestina.

Ano passado eu bati num carro, mas chamei o tomador de conta e passei para ele meu nome e telefone. Isso é coisa de homem fazer. Quer dizer, não vou falar que o cara que fugiu não foi homem. Isso já tinha ficado óbvio no momento em que ele saiu de casa para pegar traveco.

Pessoal me falou para ir à polícia registrar queixa. Bem, isso seria difícil, já que eu tinha tomado alguns drinks (tá, cerveja). Por mais que estivesse certo, iria preso somente pela audácia de ter ido à polícia com hálito etílico. Esperei até o dia seguinte para ir à delegacia. Porém, no dia seguinte tinha um almoção. E você sabe: Almoção, cerveja; cerveja, almoção. Mas fui assim mesmo aos dois eventos. Leozão foi dirigindo pra mim.

Na delegacia havia quatro computadores bem no meio de uma salona, com várias pessoas encostadas na parede. Não entendi muito bem a dinâmica do local. Direcionei-me a um pitboy de camisa apertadinha sentado frente a um dos computadores:

- Perguntinha.

- Pois não, mermão.

- Como é o esquema de atendimento aqui?

- Aí, é sobre o que, cumpadi?

- Queria fazer uma ocorrência.

- Ocorrência de que, parceiro?

- Batida automobilística.

- Amizade, isso aí é somente no Detran, entendeu?

- Sóóóó.

Fui a três delegacias naquele domingo, tentando não deixar transparecer meu estado etilicamente alterado. As três me disseram que eu só ia conseguir resolver meu problema no Detran. E sabe o que eu concluí disso? Que somente o Detran ia resolver meu problema.

Segunda-feira fui à delegacia do Detran. Várias pessoas chegavam alteradas, direcionando-se para a pessoa que entregava as fichinhas de atendimento, batendo a mão no balcão e contando suas histórias. O cara da fichinha prontamente estendia a mão com um papelzinho com cara de “aham Cláudia, senta lá”.

Bati o recorde do Snake duas vezes enquanto estava na fila. Também aproveitei para dar um pouco de aula de legislação de trânsito para alguns que aguardavam atendimento:

- Fui pego de moto e sem capacete. Isso é multa leve não é?

- Isso mesmo.

- Isso dá quantos pontos? Dez?

- Exatamente. Alguém mais aí tem alguma dúvida? Você aí de trás.

Depois de um tempão chegou minha vez. E olha que minha fichinha estava escrito 02. Na hora que o atendente me pediu para relatar o ocorrido, não sei por que, comecei a falar como se fosse policial:

- Olha, eu estava trafegando na rua Ceará, convergindo na avenida Afonso Penna, confere? O elemento que estava na minha frente deu marcha ré, provocou avarias no meu pára-lama e evadiu do local, positivo?

Pensei: “Agora sim vamos ter um pouco de ação por aqui”. Momentos depois o atendente me estende um papel escrito o que eu tinha relatado a ele:

- Prontinho.

- É só isso?

- Ééééé.

Que legal! Agora tenho por escrito uma coisa que eu já sabia. Pensei: “O que eu vim fazer aqui?”. Na verdade, de uma coisa me serviu: Ali tinha o nome do dono do carro: Jeovany Silva M. Carvalhais. Rá! Agora eu vou fuder esse cara com areia! Se bem que isso deve agradá-lo. Procurei tudo que pude na internet sobre ele. Sim, até mesmo no Orkut. Ia chegar na página dele com um “me add, filho da puta?”.

Impressionante como, numa situação dessas, aparece um tanto de gente com contatos dentro da polícia ou do Detran, oferecendo ajuda. Tudo que achei foi que o nome dele apareceu num relatório das multas que não conseguiram ser entregues porque o correio não conseguiu achar o endereço dos destinatários. Ah, que animador! E as multas eram todas do Celta HJE-2677. O roda dura tinha cinco, ao todo.

Por acaso o nome do tal Jeovany apareceu na nova lista telefônica, que saiu na semana seguinte. Liguei pra lá algumas vezes, mas só fazia um barulho estranho. Não que eu quisesse resolver qualquer coisa por telefone. Se ele atendesse, eu desligaria e me dirigiria à casa dele. Como ele mora do outro lado da cidade, eu não queria correr o risco de chegar lá, não encontrar ninguém e perder viagem. Ainda mais naquele bairro sinistro, onde eu já tinha sido assaltado a mão armada. Oh sim, eu namorava uma menina de lá.

Decidi que ia lá no sábado de manhã, ouvindo uma musiquinha. Se eu não o encontrasse em casa, iria encarar a viagem como um passeio. Pensei em ir com uma faca de cortar pão debaixo da manga do casaco. Um homem prevenido vale por dois. Em lá chegando, uma doméstica me atendeu:

- Olha, a dona Jeovany está dormindo.

Oh! Jeovany é um nome feminino. Valiosa descoberta. Passei duas semanas odiando um nome, e nem era o nome certo. A empregada:

- Mas quando foi essa batida?

Achei que era muito enxerimento da serviçal, mas respondi. Ela me disse que o marido da dona Jeovany havia saído e que não sabia quando o doutor voltava. Resolvi atocaiá-lo na porta. Pena eu ter deixado minha camuflagem em casa. Não demorou muito até o véio chegar. Ele explicou-me de que o carro era do filho dele, que estava trabalhando. Descobri que o menino era caixa. Coitado, deve gastar o salário do mês inteiro com os travecos.

Minha mãe sempre me disse: “Quanto mais se mexe na merda, mais ela fede”. Baseando-se no sábio ensinamento, não mencionei nada sobre os travestis. Fora isso, a informação poderia ser usada como arma. O véio era solícito; deu-me o telefone correto da casa e me explicou o porquê de eu não conseguir ligar para lá:

- É que eu fiz um acordo com a GVT no nome da minha mulher. Mas acabou que eu desisti no meio do caminho.

Ficamos falando mal da GVT por alguns minutos, depois eu fui embora achando muito simpático aquele senhor. Mais tarde naquele dia liguei para falar com o filho dele que já foi se adiantando:

- Pode ficar sossegado, que eu vou pagar tudo.

Obviamente ele estava com medo de eu soltar a matraca. E olha que eu estava com a língua coçando. Concordei em ir na segunda-feira com o irmão dele até o lanterneiro da família. Que emoção! Agora eu conheceria toda a família Carvalhais.

No lanterneiro havia uma pequena comitiva, formada pelo irmão do pegador de traveco e cinco homens sujos de graxa, que tentaram desacreditar a minha história, mostrando que o Celta não tinha nenhuma batida. Eu pensando: “E eu quero lá saber de Celta? O que me interessa é o meu carro batido”. O acidente tinha sido duas semanas antes. Tranquilamente deu tempo de arrumar o carro e fingir que nada aconteceu.

O irmão talvez tivesse sido escolhido como representante da família porque falava alto. E grosso. E tinha um aperto de mão firme e sacolejante. Mas nada que pudesse intimidar Tio Didi. Ele ainda revelou que o pai tinha nove irmãos e que estava processando todos eles. Linda família com que resolvi me meter.

À noite liguei novamente para ver como resolveríamos aquela situação. Foi o pai quem atendeu. O senhor simpático tinha se transformado no capeta:

- Olha, esta nossa conversa está sendo gravada. Te aviso que, se você voltar a ligar aqui ou aparecer aqui na porta da minha casa, eu chamo a polícia. Você já está me importunando.

Se o que ele dizia era verdade, deu nitidamente a impressão de que eu era um psicopata. Porra, fui na casa do cara duas vezes só. E aquela era a terceira vez que eu ligava:

- Desculpe eu ligar a essa hora, mas me disseram que era o único horário em que eu encontrava seu filho em casa.

- Meu filho está dormindo na casa de um amigo.

Dormindo na casa do amigo? Jesus, tem pai que é cego mesmo. Esse aí camufla.

- E qualquer coisa que você quiser resolver, rapazinho, vai resolver comigo.

- Mas quem estava presente na batida era o seu filho. Ele já tinha assumido que bateu no meu carro.

- Olha, eu tenho um laudo da Chevrolet que comprova que nada no meu carro foi reparado.

Fiquei impressionado em como ele tinha arranjado um laudo da Chevrolet em menos de um dia. Não sei se o moleque arrumou o carro e o pai não sabe ou se o pai realmente estava acobertando o menino. Tudo que sei é que aquela era uma casa cheia de gente, mas não tinha nenhum homem. O interessante é que o tempo todo eu esperava o véio bater o telefone na minha cara, mas ele preferia bater boca comigo. E eu já não gosto, né? Acabei soltando a história dos travestis, eventualmente. O véio, sempre solícito:

- Olha, se você quer os seus direitos, vai na justiça. O fórum fica ali na Augusto de Lima.

- Tudo bem. O senhor pode aguardar.

Tentei convencê-lo de que tudo que puder evitar usar a justiça é preferível. Como não consegui, resolvi fazer sua vontade no dia seguinte. Fui ao endereço indicado por ele e me dirigi à atendente:

- Com licença, onde fica o Tribunal das Pequenas Causas?

- Não é assim que fala.

- Perdão?

- Não existe isso de Pequenas Causas. O que existe é o Juizado Especial das Relações de Consumo.

- Tá. Onde fica?

A mocinha me deu um endereço. Fui ao lugar indicado por ela. Lá, pedi informação a um moço de óculos escuros de frente para um computador, que sequer se mexeu. Pensei: “Moço, você é cego, não surdo”. Mas lá me deram um terceiro endereço, onde me pediram uma porrada de documentos. Não dá pra pensar em outra coisa a não ser que eles se esforçam ao máximo para fazer você desistir do processo. A própria mocinha que atendeu disse pra eu ligar pra ver se adianto minha audiência, já que sempre tem gente que desiste no meio do caminho. Tomara que eles aceitem boletim de ocorrência com círculo de café em cima.

E isso é tudo o que eu tenho da história, por enquanto. Mas já se percebe que a parte mais divertida está por vir. Ainda mais se usarem as conversas gravadas. Desde o início, eu pensei em deixar o caso de lado. Quem me conhece sabe que eu não estou nem aí de andar na rua com o carro todo batido. Sou porco, mesmo. Só estou seguindo em frente por causa da atitude idiota dos Carvalhais. E, se eu não ganhar (o que é muito provável), sempre se pode tacar uma pedra no vidro do carro.

9 Comentários:

Rafaela disse...

Mal posso esperar pela Parte II!
Ah q saudade desse blog...
branco ficou bom!
Bjo

Tio Didi disse...

Então torça para ter muita confusão na justiça para ter uma parte II boa.

Édio Azevedo disse...

Olha, na verdade, vc tem que ir no Juizado Especial de Acidente de Trânsito, que fica na via expressa.

Tio Didi disse...

Anotado.

*Robertinha* disse...

se precisar de advogado eu conheço um muito bom...

Tio Didi disse...

Acho que você me será mais útil, Robertinha. É caso pra veterinário tratar.

*Robertinha* disse...

precisando dos mes serviços e so falar...
faço um precinho bem camarada...

Unknown disse...

Diii não sabia que vc gosta de traveco!!

Tio Didi disse...

Pois é, eu sou assim. Quanto mais você conhece, mais você se impressiona.

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